Por um país onde os presidentes sejam aquilo que realmente são: agentes públicos
“Infeliz a nação que precisa de heróis” – Bertold Brecht
Presidentes não são deuses.
Presidentes não são heróis.
Presidentes não são mitos.
Presidentes são agentes públicos eleitos pelo voto para administrar um país.
Apenas isso.
É claro que o minimalismo da sentença não contempla pontos nevrálgicos do cargo, como, por exemplo, o complexo papel de ser o rei no xadrez político nacional, nem a colossal responsabilidade de quem deve zelar pelo bem-estar de milhões de pessoas, entre outros pontos bem mais densos (e tensos).
Entretanto, desbastando aqui e acolá, um presidente é isso. Um agente público, com pressupostas competências e um plano de governo, escolhidos pelo sufrágio universal para ser chefe de Estado.
No meu entendimento, talvez fôssemos uma nação muito mais avançada se encarássemos nossos políticos de uma forma mais simples, técnica e racional (como expresso no parágrafo anterior) e menos passional e submissa (como tradicionalmente fazemos).
Isso porque temos o hábito de envolver políticos em geral, independentemente do partido ou de sua linha ideológica, com uma aura de deidade, um que sebastianismo, pintando-os de forma idealizada, como se fossem seres acima do bem e do mal que abdicaram dos seus anseios particulares para salvar a sociedade.
E esse manto messiânico que colocamos sob as costas de nossos políticos é uma das piores coisas que podemos fazer.
Em altas doses, poder e popularidade são uma mistura corrosiva para os alicerces da democracia, da justiça, da harmonia entre os poderes, do bem-estar social, da transparência e da ética.
Essa combinação cega cerceia o poder de análise imparcial, da autocrítica de boa parte da sociedade, direcionando o país para caminhos tortuosos.
Levar políticos nos ombros em meio à uma multidão de simpatizantes é dar-lhe carta branca para fazerem o que quiserem. E quando isso acontece, todos sabemos o desfecho.
Inebriados pelo sucesso, esses políticos, mesmo quando inicialmente e/ou supostamente bem intencionados (o que é raro), deixam-se levar pela soberba, pelo orgulho, adotam medidas oportunistas, passam por cima da lei, constroem relacionamentos inescrupulosos, se apegam ao poder e à liturgia do cargo e acabam dando origem a uma tragédia em pequenos atos que, invariavelmente, não tem um final feliz pra ninguém.
Nossa história está repleta de casos assim. E esse roteiro nefasto está se desenhando com o atual locatário da faixa, cujo caráter caudilhesco está estampando na testa e nos absurdos que profere com a naturalidade de quem chupa um Chicabon.
Mas, analisando friamente, a culpa não é exclusiva dos políticos. Longe de mim querer transformar a vítima em algoz, mas nós, como cidadãos, temos que reconhecer nossa parcela de responsabilidade nesses processos.
Eu, por exemplo, algumas vezes fui - e ainda sou - omisso em várias questões político-sociais nas quais deveria ter sido mais incisivo e também já me deixei levar por retóricas falaciosas.
O fato é que ao compactuarmos com essa idolatria bovina e terceirizarmos a responsabilidade pelos rumos do pais a alguns poucos milhares de pessoas (incluindo aí vereadores, deputados, etc) passamos a ideia que estamos de acordo em sermos coadjuvantes nessa história que eles redigirão.
Aí está o X da questão. Não podemos deixar que isso aconteça. Não podemos continuar mantendo essa postura passiva, votar e “torcer para que tudo dê certo”, como se estivéssemos comprando uma rifa ou uma cartela de bingo.
Democracia não é um jogo de sorte ou azar, cujo resultado não depende de nós. Democracia é muito mais do que isso. Temos que ser mais participativos. Retomar nosso protagonismo. Nós temos o poder. Nós somos o poder.
Imagine que você é dono ou ocupa um cargo decisório de uma empresa. Quando você contrata um funcionário você não o contrata e fica torcendo para que dê certo, com uma postura passiva.
Você – ou alguém da sua equipe - tem que acompanhá-lo, orientando, cobrando, estimulando, dando ideias, corrigindo, participando, e, claro, analisando seu desempenho. É assim, com essa mentalidade de protagonismo, que devemos tratar nossos políticos. Eles são funcionários temporários contratados por nós para nos servir.
Quando tivermos a consciência de que quem está no comando somos nós e passarmos a tratar nossos presidentes e outros ocupantes do executivo, do legislativo e do judiciário de uma forma mais serena, como seres humanos normais, trabalhadores pagos pelo erário para servir o país e cumprir com o máximo de competência e honestidade seus afazeres, o Brasil será muito melhor.
Presidentes devem nos servir. Assim como governadores, prefeitos, senadores, deputados, vereadores. Eles são nossos funcionários. Nós não somos subalternos a eles. São eles que nos devem prestação de contas.
Políticos não são seres divinos, santos altruístas dotados de conhecimento extraterreno que nos levarão à glória. Isso não existe. Ninguém descerá do céu para nos salvar. Eles são gente como a gente, exercendo um trabalho público. Só isso.
Por isso, deles não deve-se esperar milagres, soluções mirabolantes, revoluções em um minuto. Devemos sim esperar e cobrar um plano de governo realista, participativo, democrático, respeitoso, inclusivo, que vise o bem de TODOS e não apenas de seus grupos de apoio.
E que façam isso sem estardalhaço. Sem fanfarras. Sem confetes e serpentinas. Apenas com trabalho, planejamento e eficiência.
Na minha opinião não precisamos de “políticos líderes”, que acham que precisamos de alguém para definir o que é melhor para nós. Líderes somos nós, sabemos o que queremos. Chega dessa inversão de papéis. Nós conduzimos, não somos conduzidos.
Também não precisamos de tecnocratas. Profissionais criados desde o berço em departamentos públicos, que tomam decisões apenas com base teórica, nunca com base empírica.
E também não precisamos dos políticos profissionais (caso do presidente atual), aqueles que se elegem e se apropriam de cargos públicos e passam décadas e décadas em gabinetes, costurando acordos visando privilégios para si e seus partidos, sem se preocuparem em serem úteis para a sociedade.
Precisamos sim de agentes públicos modernos e competentes, alinhados com REALIDADE do país (a maioria dos políticos parece morar em outro planeta, tamanha a dissociação com a vida dos brasileiros), que cumpram os afazeres demandados por nós com eficácia, honestidade e em prazos decentes.
Precisamos de agentes públicos espiritualizados, alinhados com os novos tempos, que tenham competências técnicas (hard skills), além de empatia, criatividade, comunicação ativa, ética, transparência, adaptabilidade, resiliência e que sejam adeptos da inovação, da cooperação e da produtividade sustentável (soft skills).
Quando passarmos a tratar políticos como agentes públicos que devem focar seu tempo em administrar para o bem de todos, e não em fazer bravatas, jogos de cena e defender apenas os grupos que lhe dão apoio, teremos um Brasil melhor, muito melhor.
Por isso, ao novo presidente, digo o seguinte:
Não seja Deus.
Não seja herói.
Não seja mito.
Seja o melhor, mais honesto e mais competente agente público que puder (por mais improvável que isso seja no meu ponto de vista, já que se trata de um representante da velha política, do sectarismo, do toma-lá-dá-cá. Mas posso estar errado).
Apenas isso.
Por que o Brasil está mudando, e o tempo de ficar só na torcida para que tudo dê certo em breve será coisa do passado.
Denis Zanini
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